O bisavô de Deolinda Rocha, Gabriel, veio de São Martinho de Paus à procura de melhores condições e estabeleceu-se em Ribolhos – Castro Daire. Era oleiro e transmitiu a arte aos filhos, António, Domingos e Zé Maria.

O avô de Deolinda Rocha, António Rodrigues, mais conhecido como Tio António Gabriel, seguiu-lhe as pisadas desde muito novo, ajudando, inclusivamente, a ir pelas aldeias a vender as panelas. Quando cresceu e constituiu família, ficou por conta própria. Dos três filhos, o rapaz foi aos 12 anos para Lisboa, mas a mãe e a tia de Deolinda Rocha ficaram a ajudar o pai. Aos domingos, iam descalças com o burro carregado vender às aldeias – sobretudo Moledo, Covelo de Paiva e Casais do Monte – e à feira de Castro Daire. Padelas, caçoilas, panelas, cafeteiras, talhas e pucarinhos do café estavam entre as peças que confecionava. “Ainda hoje ouço dizer que a louça dele era muito boa, não rachava com facilidade”, diz, com orgulho.

Conta a nossa interlocutora que quando os clientes tinham poucas posses, pagavam com bens alimentares. “O meu avô costumava dizer que não deixava ninguém sem uma panela para fazer a sopa”, recorda.

António Rodrigues trabalhou em olaria até 1971, altura em que aceitou uma proposta para emigrar para França. Durante dois ou três anos, ainda fazia peças nas férias para a esposa vender, mas depois acabou por terminar a atividade.

Porém, entre uma coisa e outra, deixou a sua marca: “AR”.
“Foi a forma que lhes foi transmitida de governarem a vida. Era uma arte. Pagavam a contribuição às Finanças e tudo. Na altura era muito dinheiro. A olaria foi a licenciatura do meu avô e dos meus tios”, salienta.

Sendo Ribolhos uma aldeia de oleiros, vários artesãos tiveram o seu nome ligado ao setor. “O mestre Albino tinha a oficina no Aido, que ficava no fundo do povo. A do meu tio Zé Maria era nas Quintãs mas a fornalha era na estalagem, tal como o meu avô. Sempre debaixo de uma ramada”, diz, com um sorriso.

O processo começava com a extração, que era feita no Carvalhal, com o barro a ser transportado num carro de vacas até ao destino. O material era depois espalhado para secar no Largo do Cruzeiro, sobre uns toldos que se colocavam no chão. “Tinha de estar bem sequinho para se conseguir picar o mais possível e depois ser passado na peneira. O que ficava na rede era novamente picado e peneirado até poder fazer-se a massa”, que o seu avô fazia questão de tratar, explica. As filhas ajudam no resto do processo, enquanto a mãe tratava da casa.

Depois de moldadas e secas, as peças iam a cozer na fornalha, numa configuração que só os oleiros sabiam. “Para nós, era um sítio onde as crianças não podiam brincar” e era também “o final de um trabalho”.

Deolinda Rocha recorda outros traços de personalidade do seu avô, “uma pessoa muito bem-disposta”. Os habitantes da aldeia iam trabalhar e pediam-lhe para “deitar um olho às crianças”, ao que ele acedia, dando aos meninos o tripé que usava para se sentar. A imaginação levava-os a andar de mota, ao mesmo tempo que cantava e contava histórias.
“São memórias que guardo para sempre”, conclui.